palíndromo
quarta-feira, 3 de junho de 2009
segunda-feira, 4 de maio de 2009
sábado, 2 de maio de 2009
Tangente
Eu devia ter anotado melhor o que comera naquela manhã, quantas horas de sono, quantos litros de ar tomara no café; que lembranças eu mastigara de desjejum, quais imagens de sonho me ocorriam à mente no abrir a geladeira.
Fato é que não notei nada em meu corpo que explicasse o feito, mas que de repente senti as faculdades mentais se dispondo de maneira diferente; e só consigo imaginar uma caixa de câmbio trocando o eixo das rodas, grandes estruturas rígidas de aço - os ditos aparelhos psíquicos de laboriar consciência - sendo postos numa configuração de todo modo inusual: marcha rara; que, com um tranco, um leve coice de uma bolha de ar estoirando, conectou certas representações em algo que tenho ampla certeza adjetivar curto-circuito: em sua eletricidade de aceleração perigosa, talvez também no seu caráter indesejado, evitado a muito custo.
Pois bem, que normalmente, se me ocorria de não reconhecer o ritmo de minhas divagações, havia-se causas claras e explícitas: me invadiam de uma sensação diferente, à qual estava despreparado; e tal se deu quando em claustrofobias ou pânicos que me atormentavam, ditas euforias, ebriedades ou sustos, cheios de treme-treme nas mãos e a respiração entrecortada, tão corpóreo que visível era.
Mas se digo 'normalmente' em um evento cuja essência incômoda se dá em sua chegada fora de propósito, inoportuna; faço-o unicamente porque tenho deixado de lado certos afazeres mentais (como o tal aqui debatido) dos quais desconfio - mesmo que com demasiada imprecisão - já terem sido um dia parte habitual de minha dieta; a ponto d'eu lhes poder um dia prever a vinda nalgum momento vindouro, e contar com esta para um projeto, um futuro, um outro tempo que me surpreendesse; mas que, d'ultimamente, não me compunham com o dia-dia, e s'excluíam do dito pensável, possível.
É difícil chegar ao ponto em que espero neste relato. Mas há uma certa relutância em saltar direto a algo que no fundo tem de tão inexpressivo que posso de muito mais alongar-me em suas constelações de relações gostosas; daí que despejo sobre tais territórios estas nuvens de letras, peças de quebra-cabeça, e seu padrão a cair me informa de uma dimensão por mim até então ignorada; porque talvez esta 'experiência vivida' ( no sentido forte, absurdo ) seja como uma semente que se nos surge no simples engolir diário dos frutos do tempo, e que nos cabe plantá-la ou morrerá; engoliremo-la e será digerida como tantas outras. Como uma pista que abre aos detetives novos leques de hipóteses - e daí me lembro duns tantos filósofos que se me diziam certas vezes: que uns textos a se voltar a definir seu objeto de pronto, tratando de esmerar suas fronteiras e envolvê-lo em grandes cobertores de adjetivos; estes só possuem intuito mesmo é de denunciá-lo, capturá-lo e pô-lo inofensivo num quadro envidraçado de exposição de borboletas.
Então entende-se que eu relute em simples derramar de logo meu trunfo (tão pequeno, tão frágil) em um discurso súbito recém-começado. Se os ventos rítmicos da prosa derem sinais de inverter de sentido, não haverá espaço para erguer à minha muda recém-plantada certas paredes de papel já-lido; e quando então o tempo mudar, não haverá o vozerio destas idéias frias e protetoras a permitir-lhe desenvolver-se escondida no plano de fundo, no silencioso olho de tornado das palavras.
Tentar entender um vivido exige tantas precauções - ainda mais quando se trata de tanto sem precedentes, e que muito de provavelmente não retornará - exige uma parafernália quase cirúrgica de esterilização do maquinário leitor, para a extração desta impressão-feto ocorrer sem matá-la, pois que é parto apressado, parto súbito antes do momento; porque esta impressão fugidia ocorreu justamente no canto dos olhos, porquanto se olhávamo-la diretamente eis que silenciava, e tanto esforço para sair de sua frente e deixá-la emergir ( tanto que nem pude intentar isolá-la, alterar os planos do dia para prolongá-la e saborear ); que não: quando vem e ocorre, ocupa todo o espaço do pensamento, de tão egoísta, de tão, "outra", que não suportaria a presença de nossos mecanismos cotidianos de elaboração.
Sei perfeitamente que não me era permitido encará-la de frente, cá-comigo e meus passados (meus tempos gordos e maiores que iriam fagocitá-la vorazes e digeri-la em obviedades) e ela lá-consigo e sua objetividade clara, dada, presa pela pata na armadilha de lobo; mas quando justamente o a-ser-examinado consistia num eu-mesmo, e ao apontar-lhe a objetiva já sumia em meu olho de observador? Adeus às câmeras!
É assim que só me lhe restam poucos fragmentos de imaginação, como se passasse por mim um arco-íris dum outro espectro de cores que não o mundano, ao qual não podia eu dirigir os olhos vermelhos-brancos-verdes-azuis, mas me deixasse borradas mangas da camisa com uns leves tons irreconhecíveis; daí que descrevê-lo passaria por dirigir-lhe tantos subterfúgios para que não fosse apagado em minhas cores oculares, que mal e mal talvez nunca chegue efetivamente a reproduzir a cor do então-dito.
Do conteúdo daquele pensamento possuo pistas, mas desta parte não posso realmente sentir falta ou separar-me, visto sei vão estoirar inda noutra feita, e delas não me cabe tanto responder. As pegadas que um animal deixa de pouca utilidade são para os dançarinos, interessados mesmo em identificar a graça com que as bestas flanam sobre suas patas, multiplicando pisadas sem objetivo. Trata-se do velho truque de enxergar estrelas tímidas: que um olhar direto as faz sumir, ao passo que dedicar-lhes o foco leve, a mente atenta às luzes que surgem no campo da objetiva que não eram de sua intenção; as companheiras acidentais da mira do observador surgem então, achando-se sozinhas, e põem-se a revelar o quanto de mundo se nos escapa na normalidade.
( Gosto muito da vez em que, no escuro de meu quarto, tentei entrever a imagem de um quadro de muito agrado antes de dormir - mas este estava negro; e quando em deitando-me já punha a fechar as vistas quando entrevi de vislumbre a imagem plena, a espreitar-me escondida no não-olhá-la )
Pois então, sei que esta feita (o tema oculto destas tantas frases que estou a enovelar) ocorreu-me diferente das tais outras a que eu começava a fingir-me acostumado, citando-as perante outros, rendendo-lhes nomes e leis de ocorrência; a tal feita tão recente, mas que deve na verdade ocupar a maior parte de meus dias, e eu nem noto, pois que a confundo com familiaridades abstratas impossíveis; ela se passava em um puro discurso mental ininterrupto, conexão de semi-lembrados em profusão de idéias novas, e narrando para mim mesmo, que afogava numa criatividade louca, uma sopa de matéria orgânica onde qualquer palavra sabia deitar raízes e frutificar; e tudo sem aquela sensação outra que lhe desse reflexo em meu estômago, nenhuma intuição que proporcionasse material para suas elaborações constantes de novidades.
Só posso dizer que não foi magnífico ou estupendo, foi mais mesmo é divertido, agradável, dito que meio não era eu: deram-me a conhecer este outro fulano, que monologava com minha voz em minhas orelhas muitas coisas, e que depois foi-se para os recônditos profundos da consciência.
É possível que haja muitos desses indivíduos disparando suas pérolas por aí, mas só o fazem quando seguros sozinhos, quase semi-ignorados, deixados de lado; e mais ainda! pois que não podem ouvir de réplicas: não existem quando na segunda pessoa! (posto que são mesmo é a primeira). Aposte-se-lhes um 'tu' e vão-se em paradoxos.
E só volta rara conseguimos abdicar de nossas queridas palavras e ouvir algo como que esta mesma nossa voz a declarar as tortas descobertas de seu vislumbre de mundo.
segunda-feira, 9 de março de 2009
pequeno lari-lara
por favor, siga a lista de legíveis, e tome cuidado
ou não
texto-petróleo
"... este capítulo ecoa num silêncio vago os gritos da página debaixo desta, pois que ela fica soando monstruosamente ..." e a tal página não existe, é imaginária, mora dentro daquela espessura ridícula, é interna às letras feias se balançando em palavrões
a picareta do Tédio de baudelaire, o monge martelando o sino para acordar Deus dos seus sonhos, o fim do mundo;
texto que é uma gozada de porra grossa, porque nunca escreve até que estoura, e se torna atropelado - literalmente atropelado: são poemas bonitos que foram arrebentados contra o muro e saíram mancando aleijados; todos cheios de cicatrizes de onde era são, mas que agora fica nascendo em outras formas de literatura, outros tumores parasitas; é uma grande aberração, com os membros em constante fornicar, multiplicar; e se dilacerando, que entram a se comer e foder ininterruptamente, se arrancando desde os cabelos até os dedos e os olhos
eu quase vejo, percorrendo as idéias incômodas, um fio de estrutura: um grande rio de sangue-esperma, que fode ou morde tudo que encontra -
a cena, a traduzir e remendar, pode ser uma simples picareta enfiada nas tripas, ou aquele pai gritando a morte com a boca vermelha maior que o mundo, ele arrebenta a relação som-imagem, de tanto que ressoam seus berros de chumbo na memória, tremendo o próprio tecido de tudo,
- e sinto tecido em tudo, tecido vivo que sangra, tenho medo de pisar no chão e desvirginizá-lo, de engravidá-lo com esse ritmo degenerado
um texto/cena que fosse um poço de lama, um poço de petróleo,
que eu enfiasse o balde e fosse sujando o mundo pútrido, com suas próprias entranhas mortas e fossilizadas há tanto, que o mundo tentava engolir e indigerir;
esperneio
é um prenúncio de claustrofobia, de pânico, não sei o que fazer,
não "faria" nada, estou aqui, finjo que não está acontecendo,
penso se vou revelar a alguém meu estado,
... acho passou, ainda existe um pouco, ainda insiste,
mas não sei o que fazer com isso, é tão ruim,
só preciso de ar, falta de ar, respirar fundo
a cena do banheiro em que quase chorei,
talvez tudo tenha sido desencadedo pela lembrança de verdeacaminho, ou hoje mais cedo,
a dor da guerra e do medo de passar pelo horror dos coveiros, e enterrar a todos, e enterrá-los vivos, bando de desgraçados;
aquele horror de vampiros e picaretas,
a cena do banheiro, dos chiliques e dos espasmos,
é o que mais me é horroroso.
o escrever é um espernear, porque não consigo me libertar destes lençóis sufocantes em que me afogo à noite simplesmente com meus espasmos físicos, preciso torturar palavras e pisoteá-las agressivo, que devem ranger nos meus dentes sua dor - quero que se contorçam, escrevo para eletrocutar a tinta
quando eu me levantar desta cadeira o sonho vai sumir, vou ao banheiro, vou perder este estado absurdo. porque proust paralisava seu tropeço porque os sonhos fogem com os movimentos: são pássaros que vêm nos bicar o umbigo quando estamos dormindo; que às vezes carniceiros nos rasgam as tripas; são moscas que vêm nos transmitir doenças, vêm defecar nos nossos olhos cheios de lágrimas -
não queria ler nada disso
acho tudo horrível
às vezes abro essas folhas e impressiono com tão estranho
nunca sei quanto aos outros
as letras gemem e estão todas tortas das torturas que lhes faço, tanto que já é difícil lê-las
sinto preso a este chão, e em breve algum mínimo estalo levará embora para nunca mais.
Isto aqui é uma carta suicida
talvez outro dia volte à vida em alguma outra dor inesperada
sexta-feira, 19 de dezembro de 2008
Fragmento
para desflorá-la com uma pá;
é túmulo que cava,
ou está plantando uma gravidez?
Que as pessoas masturbam as barras do metrô numa generosa pole dancing é óbvio.
Quais são as roupas da Terra?
Seriam os lagos óculos enormes?
E os rios lágrimas escorrendo
já mais pela arte dolorida.
quinta-feira, 20 de novembro de 2008
Como ler
lambem-lambem
lêem uma vez enquanto assistem televisão
uma vez e meia.
lêem pela metade.
lêem uma palavra direito, e falam "Aha!"
saem a comentar quatrocentas páginas, sorridentes
(já podiam ter ido para a casa que os pariu,
dormir e escovar o cabelo)
que diabos?
se é um texto, se é escrita
(aviso que isto aqui não é escrita; é só um palavrão)
então é igual a uma escultura:
não basta uma foto!
faltam os ângulos...
uma vez
comentaram para mim:
"seu texto fica melhor quando lido de cabeça para baixo"
demorei um ano e um dia
para entender
que ele lera meu texto
de trás-pra-frente.
amigos!
letrinhas são como um monte de formiguinhas
estão aí,
à disposição,
para que se brinque de assassínio e de perversidade.
vivem só para serem pisadas, em números de sapateado.
Um texto é feito para ser invertido,
para ser dobrado e amassado,
para ser usado como papel-higiênico.
Um texto é útil.
Se lhes ensinaram no colégio
que as páginas ficam em pé sozinhas
todas reverenciando o deus-sol
calmas e fáceis;
lembrem sempre disso:
aqui, onde eu moro, venta muito,
e as folhas estão sempre na ordem errada.
leiam uma
duas
leiam os dedos dos pés
tentem ler um texto
como se ele estivesse na frente dele mesmo.
Tirem-no da frente.
Jornal
só serve
para fazer barquinho
e avião
e principalmente chapéu.
não leiam jornal.
quarta-feira, 19 de novembro de 2008
pânico
ofegante sem parar, meio desesperado, e isso foi o mais incrível
mais do que todo o espetáculo, a verdadeira ação foi interna, foi no peito, doía tanto, a percepção, algum tipo de infraestrutura básica fora abalada, não era em nível conceitual, ou mesmo de sentimento: era antes disso tudo, eu doía e perdido.
eu já nem lembro. e os nervos à flor da pele, saí correndo do banheiro, estava quase chorando de desespero, e sem saber porquê. só me fez mal.
se me encostassem, se me viessem me tocar, eu gritava, eu ia explodir de horror, um desprezo-desespero, estavam todos tão doentes e eu só queria sair dali, só sair dali, socorro.
Greenaway falava tanto de aprisionamento, em malas, em prisões, em casamentos, e eu só me sentia encurralado; no fim, era uma sensação muito profunda, muito mais profunda do que amor ou ódio: era simples vertigem, simples pânico desesperado de se ficar esperneando horas afogado, espasmos, espasmos, não ter jamais por onde sair daquele pânico horroroso, frenesi ébrio e sem nexo que eu já vislumbrara em noite, que tenta ser pura dor horrorizada; dor das aflições, dos tremeliques, dos tiques ensandecidos, de todos os músculos tensos se contraindo, um corpo eletrocutado à espera de mais dor, dor que nunca vem; porque é o mais terrível de todos, que sabemos que vamos morrer e nunca morremos, e os segundos de certeza antes de alguém esmurrar-lhe a face, espancar-lhe por horas até nunca com barras de ferro, aquela certeza aterradora de que haverá dor, e será pior de tudo: odiar o presente, odiar a vida, odiar a existência, querer ser simplesmente erradicado, arrancado do mundo feito um carrapato; é a certeza de que será um Monstro - pois que metafísico, monstro imaginado, alucinação febril. a única sensação é de um total esmagamento sem ar, ser prensado por um milhão de toneladas; sensação de presa, cercada pelo predador, sabendo-se com segundos contados, o desespero mais forte do mundo, em que tudo conspira para arrebentar a própria carne; quanta dor não exala pelos ares, não irradia de chamas por essa simples covardia impossível - invertida, o maior covarde de todos, e já não tem pra onde ir, e aí o mundo vira de cabeça para baixo e é ele quem vai pular nos pescoços de todo mundo; na verdade ele é o pior de todos, ele desperta em fera abominável, de dentes enormes de arrancar carne, de rasgar rostos ao meio como folhas e jogar na fogueira dos olhos tresloucados.
terça-feira, 18 de novembro de 2008
Verdeacaminho
domingo, 2 de novembro de 2008
Lugar-comum
é o que se chamava, antigamente, quando as pessoas sabiam falar direito, de 'grupo de gigantes'.
o que sempre reconheci como um monte de metades de idéias, lançadas ao espaço pela filosofia louca de um lugar-comum.
É isso aí que eu batizo de hifenização da sociedade;
palindromização da sociedade;
desconstrução da sociedade, sociedadização da sociedade s.a.
'Ora, quem é essa tal de sociedade - com quem você anda saindo, dia e noite, e volta só na segunda-feira à tarde,
bêbado,
sujo,
em trapos?
Essa piranha que te levou a falar mal dos sentidos engraçados,
daquela fase azul daquele pintor feio,
de um macaco em cima da árvore - que bonito! que bucólico!
de um não-sei-o-quê ilegítimo que só atrapalha na hora de transar?
Logo tu que antigamente era safado,
que gostava de desenhar mentiras na parede,
que não sabia dançar;
Logo tu que nunca soube sonhar em voar?'
Ah, não sei nada disso, eu só digo, sem saber o quê:
ih! inventem seus próprios léxicos de nadafazeres inúteis.
aí nós poderemos digladiar fantasmas, sem lençol - vai ser divertido! vai ser infantil, mas dane-se, que é festa-sesta na cidade-aventura de Mil-direção!
'lençol' - isso é o que eu chamava de papel branco,
terça-feira, 19 de agosto de 2008
e que ele me serve de álibi
quando sou fraco e sujo
ele me mostra que sou forte e corajoso
ha, vou brincar de bonecas quando sua mãe não estiver olhando
porque quanto mais a gente chora em um canto qualquer do quarto ela vem com o rolo de macarrão na mão roçar as minhas faces úmidas de lágrimas e rir uma risada enorme. eu a odeio.
quando então a matarei, que já nem sei.
quinta-feira, 12 de junho de 2008
Já é tarde
Naqueles momentos nos quais a solidão cansa no peito, e se busca com desespero as imagens belas dos dias bonitos e amarelos.
Mas não:
que os dias bonitos já são há tanto,
já se agüenta a distância até já nem notá-la mais,
que aquele jovem coração feito de chamas claras, brancas e vivas,
ele está afastado há tanto de qualquer outro:
que as teias de aranha da indiferença vêm crescendo,
e que os sonhos já também perdem o sentido,
que já se vive em função de ideais de gelo;
tanto mais terrível por ser um sono tão leve,
Ah! Qualquer brisa me acordaria!
Brisa mesmo que nunca vem.
E cada vez mais sensível aos mínimos suspiros,
e cada vez menos eles vêm.
A vida é bela e implacável - como aquele quadro de musa que guardo no meu quarto,
e que às vezes fecho-lhe os olhos para lhe sentir saudade,
e que já prometi só me deixar vê-lo quando puder sorrir de novo - e por nada,
mas que já fiz a promessa também há muito,
e que já mesmo as paixões mais infantis vão se tornando hábito cinza e desgastado.
Mas aquele distante olhar de alguém que nunca existiu.
Lembro que um dia eu era aqueles olhos,
Quem sabe se algum dia não lhes dá na telha das correntes de destino que agrilhoam este navio de existência, não se viram como as marés em sua dança lunática de fim dos tempos, e nos deixam abalroar algum recife! para novamente podermos afundar nessas águas revoltas, poder chorar rios de lágrimas! - que nunca mais chorei lágrimas nessa odiosa calmaria morta e seca.
Estou reduzido a planejar vidas idiotas com todas que vejo e odiá-las escondido.
E já não entendo quando, trêmulo, no escuro, me enrosco na cama e sonho com infinitas daquelas que já amei algum dia, mas não adianta,
que até aí já não as lembro direito.
Não-lembrar: é o maior desespero,
não-lembrar dos maiores amores que doíam insuportavelmente.
domingo, 11 de maio de 2008
Noite II
tão chorando como os pelados,
tão sozinho como os pelados,
e vai lá e salta num súbito,
salta das trevas, em espasmo,
rasga todas as vestes vizinhas,
grita e mata
morde e mata
gritando e sorrindo
bebendo sangue e sorrindo
fumando e sorrindo
rasgando carne
rasgando vestes
rasgando pálpebras com garras de aço em sorriso estático,
o sorriso duende,
sorriso vampiro.
sexta-feira, 2 de maio de 2008
Que é o elfo? (rascunho)
Que é o ser alado de vislumbres
e explosões de artifício arroxeado,
e névoa e não-estar-ali?
Que quando se olha não se pensa,
e quando se pensa não se olha,
que só existe, concretamente, quando não importa,
e não responde perguntas: a não ser quando é segunda pessoa,
porque a essência da segunda pessoa não é estar à vista
("estar à vista" - isso é das terceiras pessoas, das fotos, das multidões de poe e walter benjamin).
A essência da segunda pessoa é interlocutor,
de preferência, invisível, ou diria-se, semi-visível,
pressuponível, extrapolável.
O elfo é aquele ser-fada que surge e distorce o mundo,
e que não deveria estar ali: talvez só exista (no sentido concreto do verbo, no sentido de levar a conclusões filosóficas dos que acreditam que as palavras têm vida e sentido próprios) talvez só exista no passado,
- que no presente nem pensamos em existências,
estamos preocupados em colorir o mundo com os olhos:
talvez o elfo seja justamente isso,
uma cor que o olho põe no mundo,
cor não de visão, mas de tato e de conversa,
cor-de-outrem; de interlocutor.
Ora, mas se já não falo mais do elfo, e sim daquele ideal essencial à razão,
aquele companheiro de todas horas,
o Outrem extrapolável da experiência cotidiana,
que pode ser eu-futuro, amigos comunicantes do futuro,
nunca do presente:
Porque se 'ambos' estão rindo dos acontecimentos agora,
depois poderão parar de piadas internas,
e conversar normais.
e comunicar normais.
Que tudo fora um grande jogo!
e na verdade sabem claro que nenhum deles existe.
Mas se já confundi a figura do elfo,
a figura do Mágico-Outro, não interlocutor, mas paisagem,
- que talvez o elfo seja justamente terceira pessoa,
ou que o diálogo com ele represente uma essência do diálogo:
porque ele é Sujeito, e jamais objeto,
ele afirma sua (ir)realidade com potência.
Se confundi-a com o nosso personagem-colega,
o que nos acompanha: o eu-memória, a memória, o futuro de lembrar o agora.
Um existir, agora, mas já em contar lembranças no futuro,
não propriamente tentando se aliar aos indivíduos de hoje
- se aliando aos do futuro.
Então o são é baseado em alianças de intersubjetividade,
de comunicação, que justamente saltam as distâncias de tempo-espaço;
enquanto o louco, que resolve-se a conversar com seus outrens onipresentes (e também presentes em lugar nenhum!),
é aquele que não enxerga suas alianças costuradas de memória,
esses cordões de lembrança que nos seguram a alma no mundo razoável do vendaval louco sacudidor de janelas da percepção.
São duas figuras diferentes.
O elfo talvez seja muito mais a fada.
Mas estou confundindo já mais outras figuras da cosmologia.
Que há as fadas-musas-bailarinas, talvez francesas,
são as flanantes; mas e o flanar masculino,
que seria justamente o elfar?
e há os vampiros de Londres.
Quando as bruxas seriam então fadas, e os vampiros elfos?
Conceitos fixos sóbrios desses não conseguem segurar a cor vibrante de suas invenções: eles saem a embriagar-se e borboletar, trocando de pele mais rápidos do que camaleão: Nuvem.
- Talvez as nuvens me expliquem as razões (deslógicas) do meu panteão classificatório interno de ideais.
terça-feira, 1 de abril de 2008
Viver (rascunho)
Não há maior demonstração de vida do que pulos e cambalhotas:
são movimentos sem sentido,
e com puro sentido;
pois que definem o movimento-em-si - é movimento sem atribulações de tempo-espaço e de deslocamento:
é dança sem música,
simples extravasamento de energia bruta;
transbordamento de raios de sensação, de negação de realidades,
de destoamento, de elfismo.
Quando a vida é tão grande que afoga o ser humano,
ele precisa correr sem objetivo! e de olhos fechados.
Correr de olhos fechados porque é movimento em estado bruto.
Porque elfar é brincadeira para crianças, é sem sentido e sem nexo, é presente sem futuro e passado, é momento.
Crianças passam correndo e dando cambalhotas e pulando, porque têm vida em excesso e por isso são tão gordinhas;
A criança é recém-chegada, é sem hábito: sem passado - e por isso só possui presente.
Conforme se envelhece o passado engorda e o futuro cresce simétrico, a não ser que se negue tudo e se viva na vida saltitante dos lunáticos!
Sair na chuva é para se molhar, é para brincar com água e com os elementos; soltar pipa é entender o vento, é roubar o vento e sê-lo, e que o vento também é o próprio soltador de pipa.
As crianças não precisam da reafirmação alheia para poder ser em tempestade; não precisam do olhar alheio confirmando - elas o pressupõem.
sábado, 22 de março de 2008
Sobre o movimento
Perguntas
O ponto de interrogação deve ser o sinal mais infeliz.
Ou o mais estúpido.
Ainda bem que os estúpidos são ingênuos e felizes hehehehehe.
aviso
alguém me construiu muros altos ao redor
- ou então fui eu mesmo.
vou culpar muitos uns e muitos algos!
não interessa culpa. não interessa nada.
para aqueles que são mortais,
aqueles que se sabem desinteressantes e banais,
os que já prevêem seu esquecimento,
que já esqueceram a si mesmos:
para nós, só podemos amaldiçoar o azar,
invejar os outros de quem já fomos aprendizes no passado.
eles agora explodem em glória mil-maior:
estão inalcançáveis - pois que eu cavei um buraco pra me esconder,
e escrevi em cima um aviso: aqui jazo. isso é tudo.
domingo, 2 de março de 2008
Dobras (rascunho)
Perguntei: seria essa situação o arquétipo da fonte de inspiração?
(Partindo de que minha noção de obra de arte seria a que me inspirasse; e de inspiração a que me tragasse ao estado contemplativo, ou que me provocasse ímpetos de compartilhá-la, ou produzir outra obras.)
Notara muito dantes que a dor é literária, que as mortes e guerras servem aos livros e à arte. Ocorre-me que esta dor em sua maior parte é de rasgo, de deixar marcas na posteridade. Talvez poéticas sejam todas as curvas no tecido do tempo, todo o questionamento do tempo-espaço cotidianamente óbvios; ou mesmo todo o pensar fora de si, o pensar através do outro, o sair do corpo e da cosmovisão do dia-a-dia.
Talvez por isso a noite inspire: esconde o mundo? É outro mundo, o mundo escuro, oposto ao óbvio iluminado.
E as drogas nos trariam inspiração pela alteração do espaço-tempo, pelo questionamento do eu ...
Porque o texto não literário, o que não inspira, que não é um mundo-em-si, o texto mais cru e frígido, desapaixonado, tomemos como o ensaio científico bruto, os dados de computador. (São os textos-reprodução-do-mundo, representação. Que descrevem pormenores como se por conceitos possuidores de existência própria, captáveis por qualquer leitor. Fingindo que poderiam descrever a música para o surdo. Fingindo que as palavras não funcionam somente através das catarses, das metáforas, do leitor reconstruindo um texto à parte.)
Talvez por isso as plantas inspirem, serem seres a se mover no tempo noutros ritmos de difícil captação. Talvez por isso as nuvens inspirem, por não serem definíveis no espaço, sempre em movimento.
Guardas-chuva me inspiram por fingir volume, por quando abrir serem explosão; que as ilusões ao serem reveladas redefinem o mundo: o choque do desmentir é grito-orgasmo, rasgo.
Repensar o espaço-tempo não é que um tipo de pensar pelo/através de outrem, reinventar o mundo. Os óculos de Proust: não procurar outras paisagens mas outros olhos.
Talvez Deleuze esteja certo e o importante nessa história toda seja o devir, a transformação. Que só importa definir estados semi-estáticos de antes-depois para perceber as marés de mudança atuantes, a lógica ilógica artística do real.
(seria viajar um grande devir?)
Que nós, povo da aparência/essência, povo das crenças no uno; o que nos leva além de nós, e nos arrasta para alhures, é desfazer esta cosmovisão.
Isto nos faz sair dos paradigmas, conseqüentemente sair dos medos e felicidades da vida mundana, se lançar externo a si e ver-se por outros olhos.
Não diria ver o mundo em sua Verdade, sua coisa-em-si; diria ver o mundo de outra forma, e a divergência entre os dois nos levaria além?
E lá vamos nós, mais uma escala no mundo dos livros, atrás de outros filósofos a assimilar. Que inferno, pois só queria escrever aquis-e-alis, nada de ficar vangloriando os já-perpétuos.
sábado, 23 de fevereiro de 2008
Round Trip (Trip das bicicletas)
De volta à Europa, à Holanda, a Haia, ao Mauritshuis, à sala à esquerda quando se sobe o terceiro lance de escadas; de volta à Vista de Delft; algumas horas de contemplação, entremeadas por pausas para capuccinos da promoção e sanduíches roubados do café da manhã do albergue, me recompensaram com a tão almejada compreensão da importância da parede amarela, a obra-prima de Vermeer.
E assim,
o mistério iniciado meses atrás por um quadro,
se desfaz,
como um laço de fita,
como um bolinho desmanchando em chá,
pois que proust se abriu em leque desde então,
conforme as páginas destrinchavam na minha frente,
e suava assimilar os eternos,
suava assimilar cézanne e bacon, e kafka e pink floyd,
a história da vista de delft e de bergotte que morre na frente dela,
e todo o contexto de uma filosofia da diferença,
uma filosofia que vangloriasse as singularidades,
veio se abrindo para mim,
quase como se esses meses no brasil tivessem sido uma longa escala nos livros,
uma pausa pra continuar aqui,
para entender aqui,
posta a própria viagem começada lá em amsterdam,
terminada aqui em amsterdam,
num reviver de tantas cenas e cenários,
tantos quadros e diálogos,
tantos filmes vivos,
uma sucessão de déjà-vus que entortam o tempo e redefinem o mundo, fazendo sentido.
terça-feira, 15 de janeiro de 2008
Cerbère

Paguei molhando pés em Mediterrâneo, lagarteando em praia de pedras, fingindo filmes franceses.
Sem dúvida tudo planos longos de gotas salgadas de mar, que terminaram indo dormir em minha língua cansada.
Paris amanheceu triste, e sem assassinatos.
a Bachelard
Ela passou aqueles dez anos de prazo esculpindo nuvens, todos os dias e noites, parada no topo de sua montanha, sonhando as belas nuvens.
(Baudelaire)
a Jonathan Strange
Nuvem escreve no céu.
Seria a grama mera tela, mera desculpa para o vento balançar os teus cabelos?
(Baudelaire)
sábado, 22 de dezembro de 2007
Noite
sábado, 1 de dezembro de 2007
sexta-feira, 30 de novembro de 2007
ViajarajaiV
Viajar contém em si um perfume já sorrindo, abre os cabelos em leque ao vento novo - vento frio e azul de nascer-sol. Quando se viaja tudo é-se semente e também partilha em magia: desrevela-se em espasmos a rejuvenescer, gritos, revitória ao sempre. Ah, como é bom viajar!
Viajar devia ser palíndromo: viajar é ida volta. Que na ida somos um e na volta dessomos de novo, desesquecemos caminhando pulos aos sabores da infância deixada atrás. Viajar é ir não voltar mais, e voltar. Glória efêmera em desconhecido, infinita em noite, engolindo e bordando todas as outras! Felizes os pássaros que viajam o ano longe, queria eu ser também músico e vaguear no porvir! Ou queria eu música - descrevo:
quarta-feira, 28 de novembro de 2007
I (rascunho)
Cena II:
sábado, 10 de novembro de 2007
II (rascunho)
Sozinho, malvestido, maltrapilho, fumante. Estava atrasado, e cada gota derrubada nos seus cabelos desviava um minuto do percurso. Relógio incessante. Fumava, cigarro atrás de cigarro. Dedos tamborilavam no casaco ansioso, maldizia o tempo.
Corria. Investido de fúria. Agarraria folhas voando. Redemoinhava ao sabor da tempestade. Era sujo, infeliz.
Numa esquina, tropeçava. O fim.
Observava um louco atravessar a rua e, intrigada, sorria-lhe.
“Quer vir comigo?”
Ofereceu-lhe espaço debaixo do guarda-chuva e ele, pingando lágrimas de outono, aceitou, com um aceno de cabeça.
Andaram. Ela sorria. Ele ainda escravo do tempo. Até que ela parou.
Em uma eternidade, os dois se beijaram. Ou foi ele que a beijou. Ou foi seu reflexo nas poças que o fez. O pensamento lhe cruzou a mente como relâmpago refletido nos olhos púrpuras dela. Que sorria, incessante. De qualquer forma, o tempo parou.
Já não chovia mais, jorrava sol nos becos sujos. Quem lhe dera saber quem era.
“A chuva acaba com todos nós.”
“Eu estou atrapalhando?”
“Você me faz companhia, eu lhe levo aonde quiser.”
Jamais entendeu o que se passou ali. Guardou aquele reflexo nos cofres mais ocultos da memória, para não abri-los de novo, não enquanto chovesse.
No dia seguinte amanheceu brilhando.
Nuvem era jovem, tinha seus anos levados a cabo de improviso, era desses insatisfeitos, que jamais haviam sentido aquele prazer tão simples de aquecer os pés na lareira e dormir ao sabor dos pingos lá fora. Era desses que inda descompreendia o ribombar repentino dos trovões no céu vazio. Mas não era de todo tolo: era também dos que são insatisfeitos, daqueles que já viram o belo e não o descobriram mais, dos que por mais que beba jamais satisfaz a sede. Dos que só beberia vinho.
Daquela feita, descobriu o sorriso do firmamento. Descobriu selá-lo carta com beijos escondidos sob as asas dum guarda-chuva. O suficiente para deixá-lo insone pelo resto da vida. Jamais voltou ele para casa, jamais conseguiu atender ao tal chamado do relógio.
Arrivou atrasado. Nada real havia ocorrido. Nada desculpava sua demora. Faltavam-lhe provas da glória que exibia. Não ligou para as punições, sofreu estóico. Sorria em eco. Os olhos, em outros tempos. Não importava que rasgassem sua carta.
Fora enfeitiçado. Sem saber como, mas fora. Não era chuva que bebia agora, havia assistido a um milagre. A partir daí, saberia a si em sonho.
Ela transbordava na paz roubada. Já não sorria, tossia longa e pausadamente. Mas satisfeita. Seus dentes rasgavam a carne macia de inocente. Era bruxa. Era dessas que não se encaixa em uma definição vaga, em um grupo a ser definido. Era um guarda-chuva, exposta ao vento e à água, ao sol e às vezes, a passantes encharcados.
terça-feira, 6 de novembro de 2007
Alegoria

Saíamos a balançar guarda-chuvas fechados ao vento, gritávamos eco! eco! no topo das montanhas cinzas.
Pastávamos.
Eis um que mordido, se fugiu e escondeu.
Eis ovelha negra.
Saíamos a balançar guarda-chuvas fechados ao vento, subíamos à sombra mais alta,
Gritávamos para fim:
Eco...
O corvo negro, a zombar e morder,
Convidava mordendo, doendo.
Um dia desses, tomado de ânimo, tomado de flecha cravada no peito,
Dessas atiradas a cegas por ela maldita,
Um dia desses saltei janela afora, jorrei sol,
Escrevi branco no céu azul.
Todos me seguiram - todos ecoando comigo;
Mas tantos abriram o guarda-chuva que levitei.
Meu algodão espalhou pelo céu e virei nuvem.
Hoje, quando abro olhos,
Fito o céu com raiva.
Tropeço-me em tantos ecos da nuvem que afoga luz,
Armo uma flecha no arco.
Que a nuvem branca virou montanha desbotada;
Que tantos flutuantes naquele céu mais parecem escarpa dura,
Parede dura, infértil, morta.
Puxo meu arco e mordo, derrubo a nuvem, ovelha de guarda-chuva.
E que nós, aqui fugidos, escondidos,
Hoje à noite comeremos a carne dos nublados,
E procriaremos aves de cor e de voz, aves da cor e da voz, corvos.
quinta-feira, 1 de novembro de 2007
Plano de Amor
tenho vontade de falar eu te amo?
Meu projeto de paixão é este:
Alvejar a passante com uma tirada de chapéu,
Transmutá-la em ser sorridente, e fim.
Que toda a relação seja assim:
Deixa-a resumir-se a sorrir-me e viciar-me
Deixa-me cuidar de providenciar sua satisfação.
domingo, 28 de outubro de 2007
Morte
Se em todos os outros encontros que tive sofri, neste, acima de qualquer um, rasguei-me a ponto de tornar-me irreconhecível. Se tento descrevê-lo é somente para homenageá-lo. Dali então minha sina era, sempre que esbarrasse nalgum sorriso comparável, reduzir-me a exclamar, brandindo um guarda-chuva fechado: «Zut, zut, zut, zut!*» e nada além. Minha morte foi tão prazerosa, ah se foi! Alguns dizem que homem nenhum deseja a morte, discordo. Explico. Anseio a morte acima de todas as maravilhas do mundo. Desde aquele encontro terrível vagueio insatisfeito com meus eus vulgares, sou eterno visionário, insaciável ante o novo. Suicido sempre que posso, sempre que é dada a oportunidade. Mas nenhuma morte ressuscitou-me tão brutal quanto aquela. Aqui faço um parêntese. Minha morte almejada é a do espírito. Não que não me ame como sou, não, Ha! Comparado com os outros que rastejam por aí, sinto-me nas nuvens, sinto-me próprias nuvens. Mas como nuvens enxergo estrelas acima, não sossego enquanto não derrubá-las, alçar-me às suas profundezas mais inalcançáveis. Se me fosse então imposto deixar a carne, dissipar-me de todo, deixando para trás apenas as poucas jóias que já confeccionei, prantearia longamente. Feita aqui a distinção, alongo-me pela morte da alma. Sim. Naquela tarde impossível foi-me aberta uma porta, uma porta que muitos já me haviam descrito, da qual já havia lido extensos louvores, mas acreditava-a fruto da imaginação dos ébrios.
“Mas o homem que vem de cruzar de novo a Porta na Muralha jamais será igual ao que partira para essa viagem. Será, daí por diante, mais sábio, embora menos arraigado em suas convicções, mais feliz, ainda que menos satisfeito consigo mesmo, mais humilde em concordar com a própria ignorância, embora esteja em melhores condições para compreender a afinidade entre as palavras e as coisas, entre o raciocínio sistemático e o insondável mistério que ele procura, sempre em vão, compreender”.As Portas da Percepção
Aldous Huxley
sábado, 27 de outubro de 2007
Cárcere
Como? Se desse modo poderei tornar à mortalidade? Mas se não será precisamente o contrário! Tolo! Rirei de ti também, reles pedaço de carne, Ha! És tão ingênuo... Acha-me ela. Quero desfrutar alguns segundos de grandeza antes de minha maldição volver à mente, antes de perceber minhas algemas inimaginavelmente poderosas. Nada pode deter a montanha, meu caro, somos meros grãos de pó, juntos seremos torrões de terra e nada mais. Quão longe está a eternidade da rocha da efemeridade da carne! E minha carne é feita de roubo e mentira, minha carne me trai e foge, me deixa preso à Imensa, à Única. Não, não, não. Já não posso mais viver como tu vives. O máximo que consigo é contemplar-te, escrever-te belos versos e contar-te minha história. Sou-te superior, no mais. Algum dia talvez atinjas minha glória de vassalo, meu naufrágio.
Vejam só, ele realmente foi! Ah, que diria a montanha sobre isso, com sua voz de uivo, seu vento amigo a roçar-lhe as faces de granito, que diria a Terrível. Consegui capturar mais um na minha sina, vejam só. Mais alguns e construirei um pequeno banco de areia, talvez não mais do que o suficiente para naufragar alguns outros e aí...! Ha!
Armadilha
Felicitava-me ingênuo, inofensivo, abri os olhos, cansado do brincar cego, do guiar-me pelas extremidades, que surpresa! Um espetáculo! E foi aí que meu plano inteiro seguiu por água abaixo e dei-me conta do erro, dei-me conta do que era tal encontro terrível com os faunos, dei-me conta de Quem me era dado conhecer ali, naquele instante. Pois estava eu satisfeito com minha vida apagada, e ria a esmo. Maldição então aquela de encontrar justo ali, no melhor parque da cidade, alguns terríveis servos da Inefável, a honrar-lhe e louvar-lhe. Mas vamos ao episódio.
Abri olhos e ouvidos ao ambiente e de imediato identifiquei logo à frente, a poucos passos de meu refúgio, o caos sendo orquestrado. Meia dúzia de fanáticos despiam-se da secularidade, desembainhavam instrumentos muitos e deles extraíam odes à sua Amada. Eram claramente servos antigos, já acostumados ao fardo: acreditavam-no dádiva celeste e divertiam-se com seu labor ingrato. Disputavam uns com os outros as atenções de pequenas manifestações da Perfeita, sua diminuta platéia de amantes, que rondava e aplaudia. Descrita a visão, passo às suas catastróficas conseqüências sobre minha paz.
De início congratulei-me e admirei, nada além. Mas conforme se deu seguimento ao culto fui compreendendo seu objetivo, vislumbrando a deusa pela qual suas vidas eles sacrificavam. E sobressaltei-me, e revirei-me, e olhei em volta para ver se não estava sonhando, o que descobri ser verdade – era um intruso nos próprios sonhos – e então em minha alma gritei e pedi socorro enquanto perdia-me nos labirintos de ilusão. Ah, como fui desprevenido! Contemplei para sempre a execução das obras apócrifas; jamais desviei o olhar. Qual lobo, colhido pela armadilha; qual amante, preso pelo pé ao túmulo da amada; qual sábio, aprisionado numa sombra de ave, talvez para nunca-mais; fiquei ali, inundado por revolta e ambição. Morri naquele momento, e hoje sou algo intermediário entre o ingênuo feliz que já fui e os faunos servis que aqui maldigo.
"Imagina. Ah, eu sou um mero aprendiz. Eu estou tentando escrever, vocês estão tentando tocar. Não é a mesma coisa? Italianos. Eu peço um violino e ele tira. Vou pedir uma música. Afina esse diabo logo meu filho. A ansiedade está me matando. Viro-me, tornar mais óbvio o foco da minha atenção. Se bem que as duas ali, até agora alemãs, violinista e cellista, belo espetáculo. Por favor, desembainhem seus instrumentos. Não dá pra morar longe disso não. Meus sonhos se passam aqui, estou intruso no pensamento. - 'Ele passa, um ar sombrio, perdido em pensamentos. Não se divisa reação no seu rosto ao cruzar com os músicos de rua. É um momento solto de poesia no meio da vida cansada. Todos os outros se repetiram demais e foram esquecidos.' - Aproximo-me: intento desvendar seus sentimentos. Zombam-se e disputam, como crianças. Erram e aceitam. É tudo improviso, não há regras. Como eu posso florear esse momento? Dá para sonhar dentro de um sonho? Só o que me ocorre é interferir. O de laranja, óculos John Lennon, sou eu.
Sou teimoso, e fico aqui horas se for necessário."texto de Munique, parque.
terça-feira, 2 de outubro de 2007
Convite
Papel,
Flutuas em correntes de naufrágio, eternas tormentas de mutação.
Persigo-te como quem sonha o acordar, aderno-te sem escrúpulos:
Sou suicida ao querer cortar-te os pulsos.
Meu corpo é o teu, e ainda foges de mim, infeliz,
Desfazes-me em tiras, mas só para melhor envolver-te:
Espalho-me pelo teu rio de navios mortos.
Quando menos esperares, estarei lá,
Invisível nas fisionomias dos teus "poetas" prediletos.
Sim, grande farsante,
Infligiste-me tamanho desespero que agora já nem sofro:
Cambaleio,
Por entre teus mares de tinta,
Trajando máscaras cinzentas de ordinário.
Querido carrasco de prazeres,
Aflijo-me com tua distância:
Como serias bem-vindo em meus lábios,
A provar-te a carne danosa,
Trocar-te as glórias de papel?
Velho inimigo,
Aguardo o dia de meu triunfo, nossa morte,
Pois enquanto me multiplico, multicor,
Teus segundos se esvaem, e repito:
És fruto do meu querer, és filho do meu pensar, és meu, meu, maldito, que não fujas, és meu, meu amado barquinho de Caronte,
Sem ti, que sou?
Nem morro, dissipo.
Impede tamanho suplício! Depressa!
Abraça-me no leito rochoso onde arranhas tua âncora!
Socorre-me destas lonjuras do comum,
Arranca-me deste oceano sempr’igual;
Comer-te-ei sem remorso,
Sorrirei ímpar.
Chama-me do que quiseres,
Fim, Amor, Musa, Paz,
Sou todos! Graças a ti!
segunda-feira, 17 de setembro de 2007
Nostalgia II
e li e recordei de cenas que não se passaram comigo
Me esqueci. Esqueci que minha vida não começa há um segundo
esqueci que estou aqui, e estou aqui há tempos
Às vezes estamos tão presentes que só estamos assim
e fechamos os olhos para a multidão de outros eus que se passaram
Os pensamentos de hoje, que lutamos para derrubar
então, postos contra aqueles todos, aqueles verdadeiros inabaláveis
Ha! Eles riem, e eu me sinto pequeno ante a força que já tive.
Engraçado, olhando de fora agora,
para um passado tão distante,
eu vejo tudo através de um vidro de Ideal
e é bom.
Pergunto: que me vale preocupar-me sem limites
e reclamar se algo não sai como planejado
se quando eu olho para trás e lembro de tudo que já sofri
eu rio e regozijo. Quero voltar, e continuar inocente.
Tempo. Me peguei olhando fotos antigas e aí sim.
Me peguei já velho, indiferente, irreconhecível, de modos que não aprovo.
Me peguei ali, olhando para mim como se eu fosse passado
me achando tolo e inocente, criança
e arrogante e descrente, velho
Me peguei outro, e me esqueci.
domingo, 16 de setembro de 2007
Nostalgia
Estava eu agora há pouco ali, sentado solto, ruminando em tolices
e de súbito me acometi de irritar-me com todos aqueles papéis jogados avulsos no arredor
e saí a catar e a empilhar, e a arrumar e a limpar.
É daquelas horas em que surge na gente um espírito fauno
que nos faz pegar e finalmente pôr em prática o antigo plano gasto
e que não pode ser interrompido senão foge e se esconde.
Só no próximo por acaso que a gente esbarra nele atrás do sofá
e começa a dança louca novamente.
Pois bem.
Dei em mim vibrando um frenesi de arrumação e já ia jogando pilhas de manuscritos janela abaixo enquanto fortificava-me num castelo de cartas amassadas seguindo a minha lógica caótica e obsoleta.
E tanto tempo gasto nisso que aos poucos o espírito faceiro me foi revirando a alma e arrumando tudo lá dentro também.
E tanto foi que de repente estou eu olhando pro velho retrato que já vi e revi
Eu digo, todo mundo sabe que às vezes a gente esbarra em si mesmo e ri, surpreso de não ter se percebido antes. O que todo mundo esquece é que nessas vezes em que esbarramos em nós mesmos nós devolvemos o olhar de louco e não só nos distraímos com o que foi mas também gritamos e berramos pelo que virou.
Não,
Não sei se foi aquele momento idílico de autocontemplação prazerosa
do velho mestre a chafurdar nas brincadeiras de juventude.
Não, não, o que eu senti agora há pouco foi um terrível solavanco
de alguns gênios no meu interior acordando do sono terrível
que os outros que vivem a vangloriar futilidades haviam induzido por venenos e soníferos.
E os pobres ao se levantar choraram e maldisseram
e dentro de mim houve confusão tremenda.
É assim: lembram-se do espírito selvagem
que eu encontrei atrás daquela pilha suja de pensamentos
que me fez começar o samba inteiro?
Pois é. Na sua reviravolta ele acordou todo mundo aqui dentro
e agora fiquei numa revolução interna
e enquanto sonho em festas passadas o futuro me balança indizível
Sabe, às vezes a gente esquece que viveu
e se vocês não pensam que eu nasci ontem, pois é, eu pelo menos pensava assim até há pouco.
Eu digo: Viva! Estou vivo! E já já me esqueço e fico me lamuriando até o próximo solavanco dessa estrada esburacada que é a vida.
terça-feira, 11 de setembro de 2007
Cena
Que no alto da montanha, sozinho, grita.
Cadê você?
Várias vezes, numa voz meio morta.
Na outra, pode ser o menino velho, chorando numa garrafa
guardando nela a pergunta.
Garrafa de vinho, com que embebeda sua mulher.
E lhe fala eu te amo.
Ah, conversar com você é como falar com uma garrafa vazia!
Musa Ruiva (de Füssen)
Seus cabelos queimam como o vinho e sua alma esconde um livro vazio.
Ela arde e brilha como o sol, e intriga, como o silêncio.
É óbvia e perfeita como a jóia,
Tentadora como a pergunta,
Ela é rubra,
Ela é fogo,
Ela é.
Ela é um lento despertar, uma ponte entre o onírico e o possível.
Uma estrela a brilhar sozinha na noite.
E graças a ela tudo tem sentido,
Ela é o objetivo,
O pólo norte dos compassos,
O guia dos navios.
Ela é uma vela solitária aquecendo o frio impossível da solidão.
Ela é três pontos finais seguidos,
Certos e repetidos,
Findando numa vasta reticência.
Um livro fantástico,
De prólogo impecável,
Com o final por compor...
Chama! Ela chama!
Ela é familiar, lembra-se dela?
Ela é a Lua.
De Budapeste
Hoje não é um dia, é uma espera. Uma pausa na corrida, hoje paro e descanso, hoje sou só, hoje não vivo, sou sombra, perambulo e vago, sou fantasma, sou etéreo, hoje tropeço em mim mesmo, hoje sou mais um, hoje não tenho nome, sou invisível, hoje não respiro, hoje não reclamo, hoje não sou. Esse dia não faz parte do futuro, nem restará no passado: está fora do tempo e da memória. Hoje eu posso ser fraco e chorão, hoje eu nem ligo. Hoje brinco com lembranças sem juízo, não avalio, hoje não amo, hoje não dói. Hoje é aquele dia que acorda cansado demais para ser cinzento, cansado demais para ser cansado, hoje o sol se demora e passa fraco e velho. Hoje... ah, que bom que hoje é só isso: um dia a mais. Hoje é uma pausa, e hoje acaba daqui a pouco.
sexta-feira, 24 de agosto de 2007
Caos I
ADEUS!
Que se morra o inverno!
Eu não agüento mais o desespero fútil dos que não foram Ah,
meus filhos.
Ah, meus filhos, Vão-se embora para fim!
Que suas perucas largas estão afogando meu mar de sonhos
E eternamente penso: quem são os dois carinhos dois
Quem são os meus, quem é o eu e tu não sabes?
Barril de paródias soltas eu!
Despejo teu conteúdo na massa,
Na, no sufoque expectativo -
Matar o desejo da comparação:
Não - me - com - pre - en - da !
Azul.
A Musa (inalterado)
Vi uma musa.
Minha musa adentrou a Vida como nonada. Fugidia, zombou-me ao rondar desapercebida. Mas, singular, na sua pluralidade de interpretações, raptou meus olhos que fuzilavam a esmo. Sua carne dourada, seu sangue mesclava-se ao infinito... Aparição maldita! Criei-te em ti mesma, impus-te tua realidade inventada. Imagem eterna dos meus sonhos, incorporo-te de súbito, irremediável. Quero-te então sem cessar. Bacante, poderias ter-te morto com um gesto, em vez disso preferes fustigar o mundo, atiçar-lhe os astros, alçar-lhe às profundezas mais inalcançáveis do teu céu. Condenas-me escravo distante, à lembrança do lânguido desespero por ti inoculado nesta alma maculada. Tua cruzada contra minha felicidade é ligeira, esfarelas o Hábito com teu sorriso de ninfa, corrompes a Beleza num átimo. Deusa caída, crucificas-me na Indiferença, largas-me sem porvir no teu rastro de destruição. E iludes-me com a delicadeza fingida duma filosofia de amores. Enganas-te, não sou tão precavido, não desconheço as correntes que me situam no oceano do teu entorno. Pranteio a dor perpétua de saber-te aqui, entre os desprovidos de arbítrio. Se houvesse a esperança de enterrar-te, extinguir para sempre esse caos terreno que te marca alheia ao Destino, mas não! Tua Imortalidade é verdadeira no fantasma do teu regressar, sei bem que a liberdade é ilusão. Bruxa, retornarias no clímax de minha obra, para tirar-lhe o sentido e torcer meu espírito submisso. O corpo que deténs agora será livrado num segundo, se primeiro eu fingir conhecer-te os subterfúgios e interferir no teu ser intocável. E meu alívio jamais perduraria, com teu retorno póstumo no semblante mais inesperado. Sou passivo servente dos teus desígnios, anja solene dos meus pesadelos, amazona pura cativada pela ordem, ímpio não-ser das mágoas mais queridas que já obtive. Amo-te, eternamente! Aceito meu encargo acima de todo o possível, tua voz muda é a sinfonia que rege meu labor. Sorrio o sorriso dos vencidos, a amargura dos apaixonados. Agradeço-te, avatar secreto da minha miséria. Resumes minha existência no silêncio que sobrevêm à tempestade, o recordar dos teus macios pecados.
Expurga-me da razão, é tudo que peço.
Maldição
Vou, com este sortilégio,
Inventar meu próprio destino.
Vou torná-la meu espelho:
Quando escrever um livro me escreverei;
E vice-versa.
Página 4
Página 3
Já conhecer os caminhos, já saber os que gosto: Aqueles também fazem sentido. ó céticos, são tão válidos quanto os belos! Mas não o são...
Beleza inenarrável, vislumbrar-te é vinho das nuvens derramado no desatento.
Futuro e passado, tempo
E se destoarem, avalio: Estão encenando o que admiro ou vão repetir o velho e desajustado ritornelo?
Que a magia do vento e a Terra me engula!
Por Heráclito, Morri (Título de um luto póstumo ao viver desenfreado de outrora)
Chove
na cidade perfeita
já não se sabe mais se se está sóbrio
pois na verdade jamais o estamos
e cada frase cai como uma pincelada
Que incrível é a escrita, reduzir este universo inteiro em uma palavra
em uma baforada,
em um gesto,
correr! gritar! pular e dançar!
está tocando música meus amigos
está tocando música: é o silêncio
pare e olhe.
As lágrimas do céu estão borrando o estático
estão querendo fazê-lo retornar à vida que representa
e tudo é só: "um momento"
estou só? solipsismo, me agüente!
cavaleiro do apocalipse
vou me afundar em um mar de palavras
descrever a morte súbita do aprendiz
tenho como mestra a realidade
fechar os olhos? para quê?
quero todas as milformas do impensado
quero chorar mais o desnecessário
há tanto o que relatar. Mas sou eu o observador
Sou eu refletido no olhar alheio que sou meu palco.
Represento para mim mesmo! Amo o espelho:
é meu amigo, sou eu!
sobre esses próximos 3:
do meu caderninho do rembrandt
escritas num dia um tanto interessante
que, se nao me engano, foi o melhor dia
eu digo, até entao foi.
nao, nao fazem muito sentido.
nem sao bonitos.
mas foram o que saiu na hora
naquela hora interminável
feita de horas roubadas do sonho.
quinta-feira, 16 de agosto de 2007
Desliga o Tempo
Desliga o tempo e vai dormir,
estou com saudade dos teus sonhos.
O sono quer chorar pesadelos,
rir o dia inteiro,
e esquecer, por fim, aquilo que importa.
Acordar: egoísmo da alma.
a título de explicação
mas vai ser tudo que eu escrevo
e voilà, nao poderei parar mais.